sábado, 11 de janeiro de 2014


                           INFÂNCIA E ABORRESCÊNCIA

Um amigo, às voltas com filhos adolescentes, que ele chama de “aborrescentes”, suspirava:

– Ah! Que bom seria se a criançada dormisse no início na puberdade e despertasse na idade adulta!

Reporta-se à complexidade desse ser estranho, instável, inseguro, impertinente, ansioso por auto-afirmação, adepto fervoroso da contestação, que olha com desdém para os pais, “esses caretas, mais por fora que braço de afogado”.

E pretende ser dono de seu nariz, embora conste como dependente na declaração de renda familiar, para todos os efeitos, até mesmo quando exercita a liberdade de decidir como vai gastar a mesada.

A solução não seria pô-lo a dormir, mas ajudá-lo a despertar.

O grande problema do adolescente é justamente o fato de ser alguém que chega ao fim de longo sono, a partir de seu mergulho na carne.

Completado o processo reencarnatório, o Espírito, que até então era pouco mais que um sonâmbulo, começa a entrar na posse de si mesmo, de suas tendências e aptidões, embora guardando completa amnésia em relação às experiências anteriores.

A proverbial relutância quanto aos cuidados do próprio corpo, envolvendo higiene, saúde, regime alimentar, sempre me pareceu mero resultado de longo estágio no plano espiritual, a chamada erraticidade, onde certamente perdeu o contato com elementares disciplinas sobre o assunto.

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Na questão 383, de O Livro dos Espíritos, quando Kardec pergunta qual a utilidade de o Espírito passar pelo estágio da infância, diz o mentor:

Encarnando, com o objetivo de se aperfeiçoar, o Espírito, durante esse período, é mais acessível às impressões que recebe, capazes de lhe auxiliarem o adiantamento, para o que devem contribuir os incumbidos de educá-lo.

Observe, leitor amigo, a importância dessa informação!

O período de infância é propício para que influenciemos o Espírito, educando-o para a vida, ajudando-o a superar suas imperfeições e mazelas.

Fragilizado, em face das próprias limitações físicas, sem condições para desenvolver iniciativas próprias, ele é receptivo aos exemplos e orientações que recebe dos adultos.

O velho ditado, de pequeno é que se torce o pepino, exprime uma realidade.


Muitas tortuosidades e viciações do reencarnante podem ser superadas com uma educação adequada, conscientes os pais de que, conforme o verso do poeta inglês William Wordsworth, citado por Machado de Assis (1839-1908), em Memórias Póstumas de Brás Cubas, a criança é o pai do homem.

Tendências e mazelas não superadas na infância, herança do pretérito, moldarão o caráter do adulto.
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Bem, e a adolescência – perguntará o leitor – para que serve?

Meu amigo diz que nesse estágio invertem-se as posições.

Na infância educamos nossos filhos.

Na adolescência, eles nos educam.

Somos convocados a exercitar a paciência, a tolerância, a compreensão, o espírito conciliador, a fim de não transformar o lar em arena de intermináveis brigas e discussões.

Dentre as diatribes contestatórias do adolescente está a expressão que costuma usar, quando chamado às falas pelos genitores, em relação ao seu comportamento.

– Não cobrem nada de mim. Não pedi para nascer!
Pretende que não o consultaram para tê-lo como filho.

Conseqüentemente, que tratem de aceitar suas inconveniências.

O impertinente não tem nenhuma noção sobre essa tolice, que proclama enfaticamente.

Se algo conhecesse sobre as vidas sucessivas jamais falaria assim, tendo em vista o contingente de Espíritos desencarnados a espera da oportunidade de um mergulho na carne para experiências redentoras.

Certamente ele pediu, sim, insistentemente, para que seus pais lhe concedessem a abençoada oportunidade do recomeço, sem a lembrança do passado, a fim de vencer paixões e fixações que precipitaram seus fracassos e o infelicitam.

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É típico do adolescente situar os pais por incompetentes que não enxergam um palmo adiante do nariz.

Julga-se capaz de fazer muito mais por si mesmo.

É bom que o faça.

Seu futuro depende disso.

Mas, certamente, quando estiver às voltas com filhos adolescentes há de mudar sua opinião, reconhecendo que os “velhos” fizeram bem mais em seu benefício do que o supunha sua pretensa sabedoria.


Richard Simonetti