A CONVIVÊNCIA PERFEITA
Mário
Vicente era vidrado na idéia das famílias espirituais, que se sobrepõem às
precárias ligações sangüíneas.
–
Pois é – dizia, entusiasmado, a um confrade espírita –, os Espíritos tendem a
formar grupos afins nos caminhos da vida.
–
Reencarnam juntos?
– Sim, sempre que possível, compondo lares ajustados e harmônicos, “um por todos, todos por um”.
– Sim, sempre que possível, compondo lares ajustados e harmônicos, “um por todos, todos por um”.
–
Você vive com sua família espiritual?
Mário
Vicente esboçou um sorriso triste.
– Quem me dera! Lá em casa nosso relacionamento funciona mais na base de “cada um por si e Deus por todos”.
– Quem me dera! Lá em casa nosso relacionamento funciona mais na base de “cada um por si e Deus por todos”.
Estamos longe de um entendimento razoável. É
muita discussão, muita briga…
Somos
velhos adversários amarrados pelo sangue, a fim de nos reconciliarmos.
–
Recebeu alguma revelação?
–
Não… nem seria preciso! Basta observar nossos conflitos.
–
A barra é pesada?
–
Bem… não é tanto assim. Gosto muito de minha mulher. Até pensei, durante os
primeiros tempos, fosse uma alma gêmea.
Ela
é dedicada ao lar, mãe prestimosa.
Ocorre que é um tanto voluntariosa e, não raro, agressiva. Faz tempestade em copo d’água.
Ocorre que é um tanto voluntariosa e, não raro, agressiva. Faz tempestade em copo d’água.
Considero a Ernestina meu teste de paciência.
Nossos “santos” estranham-se freqüentemente.
–
E os filhos?
–
Adoro todos eles, mas são Espíritos imaturos que me dão trabalho e, não raro,
desgostos.
Pedro,
o mais velho, envolveu-se com drogas! Júnior, o do meio, “aborrescente” típico,
vive a me questionar; Jussara é delicada e sensível mas puxou o gênio da mãe.
Se contrariada, sai de perto! Um horror!
– São seus credores. Cobram prejuízos que você lhes causou em vidas anteriores…
– São seus credores. Cobram prejuízos que você lhes causou em vidas anteriores…
–
Certamente!
Estou consciente desse compromisso.
Tento o fazer o melhor, sustentando a estabilidade do lar. No entanto, não é
Estou consciente desse compromisso.
Tento o fazer o melhor, sustentando a estabilidade do lar. No entanto, não é
Às
vezes perco o controle.
Envergonho-me das brigas em que me envolvo… Convenhamos, porém, que ninguém é de ferro!…
Envergonho-me das brigas em que me envolvo… Convenhamos, porém, que ninguém é de ferro!…
Mário
Vicente suspirou, emocionado:
–
Sinto falta de um relacionamento familiar sustentado por legítima afinidade.
Todos olhando na mesma direção, empenhados em cultivar a paz, o trabalho do
bem, a amizade, a compreensão…
Seria o paraíso!
Vejo-me
como um retardatário, preso a compromissos decorrentes de besteiras que andei
cometendo, purgando meus débitos. Certamente aprontei muito!
–
Espera alcançar a família espiritual?
–
Claro! Quero cumprir minhas obrigações, fazendo o melhor…
Hei de merecer um retorno ao convívio de meus
queridos, em estágios mais altos…
Tenho
convicção de que uma companheira muito amada espera por meu sucesso nas
provações humanas, favorecendo abençoado reencontro.
***
Animado por seus sonhos, Mário Vicente esforçava-se por
superar as dificuldades de relacionamento junto à esposa e filhos. Tolerava
suas impertinências.
Fazia de tudo
para ajudá-los. Exercitava carinho e compreensão.
O cumprimento de seus deveres junto à família humana
haveria de lhe proporcionar o sonhado reencontro com a família espiritual.
Passaram-se os anos.
Os filhos casaram, vieram netos, ampliou-se o grupo
familiar, sucederam-se compromissos e problemas.
Nosso herói até que conseguiu sair-se relativamente
bem, acumulando méritos.
Aos setenta e dois anos, retornou à Pátria Espiritual.
Espírita esclarecido, não teve dificuldade para
reconhecer-se livre do escafandro de carne, amparado por generosos benfeitores.
Após os primeiros tempos, já adaptado à nova situação, procurou dedicado orientador da instituição socorrista que o abrigara.
Foi logo pedindo, inspirado pelo ideal que acalentava:
– Estimaria, se possível, receber notícias de minha
família espiritual…
– Seus familiares estão bem, nas lutas de sempre,
sofrendo e aprendendo, como todos os homens.
– Estão reencarnados? Pensei que os encontraria aqui!
– Você conviveu com eles… Não sabe que continuam na
Terra?
– Não me refiro à família humana. Anseio abraçar os
entes queridos de priscas eras, sobretudo a amada companheira perdida nas
brumas do passado…
O mentor sorriu:
– Falou bonito, mas está equivocado, meu amigo. Sua
família espiritual é aquela que lhe marcou a experiência na carne. Sua esposa é
uma alma de eleição.
Os filhos são
antigos companheiros de jornada evolutiva. Desde remoto passado vocês vivem
experiências em comum.
– Mas e os nossos problemas de relacionamento?
– Haveriam de experimentá-los mesmo que se
transferissem para a esfera do Cristo. Como ensinava o Mestre, ainda há muita
dureza no coração humano.
– Que devo fazer?
– Você julga-se um retardatário. Na verdade, não
obstante suas limitações, está um pouco à frente do grupo familiar, ainda lento
na aquisição de valores espirituais. Tem, portanto, o dever de ajudar.
Foi essa a sua
tarefa na última existência. Será esse o seu compromisso agora, exercitando a
função de protetor espiritual junto aos seus.
E Mário Vicente, que tanto ansiara por sua família
espiritual, constatou que estivera com ela durante décadas, sem se dar conta
disso.
Muita água rolaria no rio do tempo, até que todos
ganhassem asas, habilitando-se à convivência perfeita.
Livro
"O Destino em Suas Mãos"
Editora CEAC - Bauru
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