AMORNAMENTO
E o nosso companheiro?
Afastou-se mesmo?
– Lamentavelmente.
Tinha excelente potencial!
Inteligente, culto, dotado de iniciativa…
– O que houve?
– Inúmeros problemas, a começar
pelo cigarro. É fumante inveterado.
Foi alertado várias vezes de que
o vício causa embaraços ao serviço do passe magnético do qual participava.
– E ele?
– Tinha explicação para tudo. Dizia que julgava importante estar em paz consigo mesmo e que o cigarro lhe dava tranqüilidade.
– Mesmo sabendo que o fumo abrevia a existência?
– Segundo ele, isso não importa.
Quer sentir-se como uma vela
gastando dos dois lados. Viver intensamente, em meio às baforadas.
– E o seu relacionamento com o pessoal?
– Em princípio razoável, mas com o tempo azedou. Era agressivo no trato com os companheiros.
– Lembro-me disso. Você chegou a conversar com ele a respeito.
– Muitas vezes.
Recomendava-lhe comedimento.
Malhava em ferro frio, porquanto,
segundo ele não podemos nos omitir diante do mal que nos façam.
Dizia que tolerava em princípio,
mas se alguém insistisse em perturbá-lo não teria dúvida em responder à altura.
– E houve aquele problema na sua atividade profissional…
– Foi a gota d’água.
Funcionário de uma repartição pública,
envolveu-se numa operação ilícita. Está respondendo a processo administrativo.
Foi convocado a explicar-se
diante da diretoria, já que era um de seus membros, mas irritou-se, proclamando
que não devia satisfações a ninguém de seus atos pessoais.
A partir daí não havia mais clima
para ele entre nós.
– É lastimável.
Ele possui um grande potencial de
trabalho. Você acha que poderíamos fazer algo em seu benefício?
– Nada além de orar. Ele está enquadrado naquele que é o pior de todos os problemas que podem envolver a pessoa que se liga a uma atividade religiosa:
o amornamento.
– Amornamento?
– Sim. A coexistência pacífica entre o que temos de bom e o que temos de ruim.
É quando encontramos
justificativa para o vício, a agressividade e a própria desonestidade, não
obstante conscientes de que estamos incorrendo em graves desvios.
– E qual seria o prognóstico para essa situação?
– Geralmente as pessoas que caem no amornamento vivem assim até que ocorra a solução final.
– Solução final?
– Sim, a morte.
Colherá no plano espiritual os resultados de
sua inconseqüência. Acabará por reconhecer seus enganos e sofrerá muito.
– Mas voltará um dia, para corrigir rumos e superar seus enganos…
– Todos voltaremos, incessantemente, até que nos depuremos o suficiente para viver em planos mais altos.
O problema em casos como o de
nosso amigo é o tempo perdido e o comprometimento com o erro, decorrentes de
seus desvios, a complicar o destino.
– Como evitar que isso nos aconteça?
– É preciso exercitar a autocrítica, usando de muita severidade conosco. Somente assim nos conservaremos “quentes” no empenho da própria renovação.
***
Vós sois o sal da Terra.
Ora, se o sal perder o seu sabor, para que haverá de servir, senão para ser lançado fora e pisado pelos homens?
Mateus, 5:13
Livro O Céu ao nosso alcance.