O repórter e o médico
O repórter pergunta ao médico nutrólogo: – “Como deve ser preparado um bom churrasco, preservando as qualidades nutricionais e organolépticas?”. Omédico responde:
– “Autoridades em nutrição do mundo todo
recomendam a ingestão moderada de produtos de origem animal, carne, leite,
ovos.
Deve-se remover a gordura visível do produto
animal. Deve-se evitar a queima excessiva da carne, isto é, ela não deve ser muito
queimada. Isto porque quando a carne fica ‘estorricada’ formam-se substâncias
cancerígenas”.
O repórter faz nova pergunta: –
“O que há de mito e de verdade com relação ao
consumo de carne bovina? Carne aumenta o mau colesterol?”.
O médicoexplicita:
– “O excesso de proteína e
de gordura animal contribui para o aumento dos níveis de colesterol. Isto é
válido para todo produto animal”.
O entrevistador se mostra objetivo:
– “Carne causa câncer no estômago?”.
O nutrólogo não recua ante o dever de informar, diz:
– “Há uma recomendação para que se modere a
ingestão de produtos animais, como se disse acima. Há dados indicando que o
excesso de produto animal pode promover a produção de amônia e nitrosaminas
(substâncias cancerígenas) pela microbiota intestinal”.
Pois bem:
o repórter estava fazendo
matéria para a Revista dos Criadores de Zebu, da Associação Brasileira dos
Criadores de Zebu.
Deveria ter sido uma
entrevista bem tendenciosa, onde toda a brasa fosse puxada para a
sardinha, digo carninha, da Associação. Mas não foi o que aconteceu. O médico
nutrólogo que concedeu a entrevista é o Dr. Ênio Cardillo Vieira, da Academia
Mineira de Medicina, PhD em Bioquímica, professor emérito e titular de Química
Fisiológica da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
Antes de o bife virar bife
Vamos ler um interessante
depoimento, também voltado para a questão do consumo de carne:
“Fisiologicamente,
conhecemos o que é termos um pedaço de carne no estômago para digerir:
o processo é lento, nos
sentimos lerdos, o intestino se torna preguiçoso.
Acredito muito na energia dos
alimentos e a influência que podemos sofrer com ela. Antes do bife virar bife,
infelizmente temos um processo muito cruel, doloroso, triste.
Os animais, já no pasto,
têm uma vida difícil.
Não é um tratamento suave. Ao serem
transportados, em caminhões, sofrem (tomam choque para não se sentarem, pois a
carne pode escurecer); antes de serem mortos, ainda na fila, percebem o que
‘está se passando’! No momento de serem abatidos, escorrem lágrimas e de longe
se escutam os mugidos...
Nessa hora o animal libera hormônios de dor e
medo. E isso vai para o prato”.
O realista depoimento, que
lembra bastante o que escreveu André Luiz sobre o assunto, pelo Chico Xavier, é
de Caroline Bergerot, escritora, nutricionista, especializada em Nutrição
Clínica.
Demonstrando moderação e
bom senso, ela conclui: “... cada um de nós faz suas escolhas, segue seus
processos.
Evidentemente não critico a
opção de ninguém, pois cada um de nós tem necessidades e condutas de pensamento
pessoais, mas é importante termos consciência do que estamos ingerindo e dos
benefícios ou malefícios que determinados alimentos podem nos trazer”.
O pensamento espírita não é
diferente.
Escala das prioridades
Muitas pessoas não se
dispõem a assumir o sacrifício das mudanças, ainda mais quando se trata de
mexer com hábitos arraigados.
No caso da ingestão de carne, alegam que há
outras prioridades em que pensar.
É certo, mas, dependendo do ângulo que se
observe, a questão pode ser refletida com muito proveito e estimular uma
modificação em nossa vida.
O que se sabe, com certeza,
é que todo exagero traz consequências.
Há muita coisa envolvida
nesse hábito humano que só agora, com as graves polêmicas ambientais, as
pandemias globais periódicas, e, por outro lado, o avanço das pesquisas na área
da alimentação, está sendo discutido de forma transparente por médicos,
pesquisadores e ambientalistas sérios, compromissados com a melhora das
condições gerais da saúde e com o desenvolvimento dos níveis de conduta humana
minimamente aceitáveis para o equilíbrio da vida planetária.
Escolha segundo a consciência
É grande o número de
filósofos, pensadores, escritores, cientistas, médicos, artistas, santos, em
todos os tempos e lugares, que se preocuparam com a questão dos animais e da
carne como alimento humano.
Fosse um problema
irrelevante, e não teriam deixado tantas reflexões e depoimentos. Todos eles se
sentiram motivados, em algum momento de suas vidas, a pensar no assunto e tomar
atitude coerente com suas reflexões.
A filosofia espírita, nesse
como em todo assunto, nada proíbe, por entender que o indivíduo é livre para
escolher segundo sua consciência.
O Espírito Lamennais, filósofo e escritor
político francês (1782-1854), assinou um texto sobre a alimentação do homem,
incluído por Allan Kardec na Revista Espírita de 1863, onde adverte que o corpo
deve ser nutrido com a matéria, “mas a natureza da matéria influi sobre a
espessura do corpo e, em consequência, sobre as manifestações do Espírito”.
Admite que “o esquecimento da carne leva mais
facilmente à meditação e à prece”, mas que “pode-se ser bom cristão e bom
Espírita e comer a seu gosto, desde que seja razoável”.
A matéria é ainda controvertida, como tantos
outros temas. Mas o tempo e o progresso do pensamento irão solucionando as
questões.
Por ora, não custa nada pensarmos no assunto.
CLÁUDIO BUENO DA SILVA