terça-feira, 14 de janeiro de 2014

              O maior caso de bullying da história

Acho que foi na primeira Bienal de que participei lançando meus livros psicografados que dei a sorte de comparecer no mesmo dia em que também lá estava o Ziraldo, de quem sou fã desde criança.

Eu colecionava todos os almanaques da Turma do Pererê, e ainda meu filho mais velho chegou a lê-los. 

E como as Bienais são uma espécie de paraíso na Terra para amantes da leitura, em sendo convidada pela editora para autografar em duas tardes, aproveitei para dedicar o máximo possível do tempo ao evento, chegando mais cedo, e me deliciando pelas muitas avenidas agitadas onde leitores, editoras e autores compartilhavam as novidades do maravilhoso universo dos livros.

Numa das avenidas, num cercadinho, com fãs infantis ou adultos para além dos limites permitidos pela segurança do autor, lá estava Ziraldo fazendo o seu lançamento. Sorridente, com seus assessores e amigos, recebia alguns leitores que queriam autógrafos, posava para algumas fotografias.

 E eu, autora modesta, em início de carreira, com um ou dois livros publicados, lá me detive por breve momento, admirando a cena, e aproveitando também para registrá-la, como todo bom visitante, com a máquina de meu celular.

É bom ser querido assim! Indizível, esta sensação de que o nosso trabalho é bem recebido pelo público, e que lhe presta benefícios.

 Bom, também, ser estimado por este mesmo público, que acata e se encanta com o produto de nossa atividade literária, comentando, ou mesmo tecendo críticas úteis ou favoráveis.

Hoje, um pouco mais adiante daquele começo, posso dizer com prazer que conheço a sensação. 

Porque nada compensa mais o autor do que esta troca enriquecedora com leitores de variadas procedências, já que assim também crescemos como pessoas.

Conhecemos uma gama enorme de indivíduos com as suas origens culturais, idiomas, pensamentos e percepção de vida, e, consequentemente, de nosso trabalho.

 Disso tudo, portanto, a lição maior extraída é a da humildade, perante a grandiosa diversidade da vida.

Mas o que isto tem a ver com o mencionado no título deste texto - o maior caso de bullying da história?

Amigos, alguém, um dia, também colheu os louros justos pelo seu trabalho, que em toda a história de nossa civilização ocidental nos compareceu como o mais revestido de importância, de validade, de luz!

Durante algum tempo, muitos que foram devagar se apercebendo do que acontecia acorreram a conhecer quem era o autor daquelas obras espetaculares de que se falava em todo canto de uma determinada região do mundo: prédicas de consolação sem igual.

 Curas! 

Auxílio e amor incondicionais, a quem quer que o procurasse em busca de algum lenitivo...

Tratava-se de um ser tão diferente dos demais, por conta destas atitudes inéditas, das ideias de vanguarda que defendia, favorecendo principalmente a gente simples daqueles tempos, que, a partir de certo ponto, todavia - e ao cair a ciência da presença daquele homem no domínio de outros, da casta mais favorecida da época - começou a incomodar!

Sim! Aquela diferença em seu comportamento, todo pautado em amor e compaixão dos sofredores, dos mais simples, começou a incomodar, principalmente aos poderosos daqueles tempos!

Pois que suas palavras e atitudes ensinavam a igualdade de todos perante a consideração de Deus.

Ensinava aos indivíduos sedentos de esperança, vindos de todos os recantos daquelas terras longínquas, que não deveriam depositar todo o sentido e objetivo da existência nas coisas ilusórias e que seriam fatalmente, mais cedo ou mais tarde, corroídas por traças. 

Dizia-lhes que deveriam dar a César o que a César pertencia, e a Deus o que era de Deus, apontando a inutilidade de investirem demasiado e exclusivamente nas coisas deste mundo - que esta postura, portanto, fosse deixada aos que dela se nutriam e que por ela se orientavam, pois aos mortos deve ser entregue o enterro dos mortos.

A Vida viva, que repousa na qualidade de nossas atitudes, contudo, deveria ser almejada por todos que já se viam fartos e exaustos destas miragens enganosas!

Vinde a mim todos os que estais cansados e oprimidos, pois eu os aliviarei... – Mateus, 11; 28-30.

Pois a diferença incomensurável existente entre estas anotações e o que, ao contrário, era defendido e realizado pelo farisaísmo míope da época, sob o peso do constrangimento romano, começou a incomodar demais.

 Quem, pois, era aquele homem que se atrevia a fazer apologia de um segundo Reino dentro de um reino institucionalizado já existente?!

Conveniente às autoridades, sentindo-se ameaçadas pela popularidade sem precedentes de Jesus, considerar as coisas assim! 

Aquilo seria o pretexto perfeito para se agir, para se abrir fogo - e logo!

Quem, portanto, era aquele homem que se atrevia a se declarar o Messias?! 

Que alegava direitos a um reino, vindo ameaçar o poder estabelecido, as representatividades consolidadas do próprio imperador romano?!

Alguma coisa deveria ser feita, e rápido.

 Ou aquele homem enigmático, incompreensível, que só respondia com solene e altivo silêncio às perguntas insidiosas que lhe lançaram no interrogatório infamante, acabaria por acossar o povo a algum levante contra o governo, que, dada as proporções supostas, seria difícil de se debelar!

Criara-se, assim, o ardil para o maior caso de bullying - de perseguição insidiosa e execução por tortura - já havido em toda a história da humanidade!

Todavia, meus amigos, qual foi a atitude do Cristo, frente a estas infâmias?

Revidou à altura?!

 Desceu da indescritível altitude espiritual de que já era portador para se nivelar aos seus algozes, com ataques físicos ou verbais de quaisquer ordens?!

Sim - outrora, nalguns instantes, frente aos fariseus hipócritas que buscavam distorcer intencionalmente o sentido de seus apontamentos, indicara-os com firmeza como sepulcros caiados, cheios de podridão por dentro -, guias cegos, que nem entram no Reino dos Céus, nem permitem que outros entrem, em distorcendo a visão e entendimento do povo para o verdadeiro sentido das coisas de Deus.

Todavia, não agiu assim no momento do testemunho.

 Porque, ali, não se tratava de defender a autenticidade daquelas verdades com palavras diante da multidão - tratava-se de defender a Verdade com a atitude definitiva, que viria validar, com silêncio, sofrimento e sangue, que o que distancia o anjo do homem vulgar é, sobretudo, a firmeza eventualmente muda, porém sólida, do exemplo!

Deste exemplo que, até os dias de hoje, mais de dois mil anos depois, se revalida, a cada dia, quando, diante da fenomenologia social tida como inédita e rebatizada de bullying, vamos dolorosamente resgatando a conclusão de que nada se modificará nos panoramas sociais do mundo enquanto não prevalecer em mentes, em corações, o entendimento de que nossas atitudes perante o próximo devem ser pautadas, em nosso próprio benefício, quanto para o bem de todo o planeta, em compreensão e amor!
E não há outro caminho!...

Christina  Nunes – o cnsolador

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

                                            Quem quer ser feliz?

A felicidade é um anseio básico da humanidade. 

A questão, portanto, não é perguntar quem quer ser feliz, mas o que é a felicidade?

Se, porém, a resposta para a primeira indagação é quase automática, as palavras para responder a segunda tendem a vir mais vagarosamente. 

Isto porque, como dizia Sêneca, não é fácil descobrir o que torna a vida feliz, pois quanto mais se procura a felicidade, mais dela se afasta.

 Sendo que - completa o pensador em seu pequeno opúsculo sobre a temática -, quanto maior a pressa, maior o erro e maior a distância a percorrer.

 Para otimizar esta busca, pois, é interessante lançar mão de algumas reflexões.

Sócrates, por exemplo, através do que conhecemos pelas palavras de Platão, ensinava que a maior de todas as felicidades é o conhecimento das essências e das verdades puras.

Em consonância com a visão socrática, e tendo em vista que o Evangelho de Jesus é um manancial de consolações e de promessas de uma alegria mais duradoura e profunda, a qual não seria deste mundo ainda, o Espiritismo ensina que a felicidade absoluta é patrimônio dos Espíritos puros que conseguiram adentrar no conhecimento das essências proclamado pelo filósofo.

Apesar disto, o ser dispõe da possibilidade de ser feliz relativamente, de acordo com o seu grau evolutivo.

Devendo, inclusive, buscar ativamente este estado. Entretanto, esta busca não se deve dar por meio de processos externos.

Ao contrário, ela está baseada:

1) na posse do necessário à subsistência do corpo;

 2) na consciência moral tranqüila; 

 3) e, em a fé no futuro.

Sem o básico para a manutenção do corpo, o indivíduo padece de condições para pensar em outras coisas além da própria sobrevivência.

Mas, por outro lado, os excessos de variadas ordens, inclusive financeiros, não são capazes de comprar a alegria, já que não logram preencher o interior do ser.

 Garantido, desse modo, o mínimo para manter a saúde física e mental, ser feliz não é uma questão de ter ou de não ter, mas passa pela capacidade de se empregar utilmente o que se possui e de não se desesperar por aquilo que, apesar de não ser possuído, igualmente não é imprescindível.

Com a consciência em paz, pode-se obter a tranquilidade almejada. A angústia pelos acontecimentos passados se dirime. 

O medo das incompreensões se esvai. E o orgulho pelas bajulações não se gera.

De igual modo, a fé tem papel crucial na conquista do ser feliz.

 Utilizando-se de comparações, pode-se dizer que ela é o “pulo do gato” na receita da vida; é a tábua final que liga a ponte construída pela razão entre a ignorância e a plenitude; é o detalhe último na alegoria da existência. Com ela, a ansiedade pelo futuro incerto se apequena.

Para a Doutrina Espírita, portanto, a felicidade é uma finalidade, mas de igual maneira é um meio pelo qual se deve buscar viver; sem lançar mão da necessidade das posses; sem se deixar ficar na angústia pelo passado; sem se deixar avolumar na ansiedade com relação ao futuro..., mas, ao contrário, procurando fazer esta construção no maravilhoso momento do hoje e do possível.


Leonnardo Machado -  o consolador

domingo, 12 de janeiro de 2014

                                                       O  ATEU E  ATOA

Que dedução se pode tirar do sentimento instintivo, que todos os homens trazem em si, da existência de Deus?
A de que Deus existe; pois, donde lhes viria esse sentimento, se não tivesse uma base? É ainda uma conseqüência do princípio - não há efeito sem causa.
Questão nº 5, de O Livro dos Espíritos
Se seu pai, prezado leitor, já se transferiu “desta para melhor”, além das sombras do sepulcro, talvez você não esteja em condições de um contato feliz, facultado pela vidência mediúnica.

Pode faltar-lhe, também, suficiente sensibilidade para perceber-lhe a presença, em eventual visita que lhe faça, pois os que vivem lá não esquecem os que vivem cá.

Mas, elementar exercício de raciocínio, ao alcance de qualquer criança, lhe dirá que tem um pai, como toda gente. Seria altamente improvável que você houvesse surgido das profundezas do nada...

E o coração lhe dirá, quando se disponha a ouvi-lo, que o seu pai continua a existir, não apenas na sua saudosa lembrança, mas como individualidade imortal que dos etéreos horizontes espirituais permanece ligado a você.

É o que ocorre em relação a Deus.

Há algo de intuitivo que brota do mais íntimo de nossa personalidade, refletindo milenares experiências religiosas, a nos dizer que Deus existe!

O ateísmo, por isso, é uma aberração. Não passa de mera pretensão da intelectualidade vazia intoxicada pelo orgulho.

No livro Trovadores do Além, psicografia de Francisco Cândido Xavier, o poeta Alberto Ferreira nos oferece ilustrativa trova:
Ateu - enfermo que sonha
Na ilusão em que persiste,
Um filho que tem vergonha
De dizer que o pai existe.
***
Em Espíritos evoluídos a consciência da presença de Deus é tão intensa que se manifesta desde as experiências mais singelas da infância.

No prefácio do livro Renúncia, psicografia de Francisco Cândido Xavier, o Espírito Emmanuel reporta-se aos seus primeiros contatos com Alcione, a personagem central da história.

Ainda uma menina, caminhava com o Padre Damiano, bondoso sacerdote que a orientava.
Com encantadora simplicidade, perguntava-lhe:

– Padre Damiano, quem terá feito as nuvens, que parecem flores grandes e pesadas, que nunca chegam a cair no chão?

– Deus – minha filha – dizia o sacerdote.

Mas, como se no coração pequenino não devesse existir esquecimento das coisas simples e humildes, voltava ela a interrogar:

– E as pedras? - quem teria feito as pedras que seguram o chão?

– Foi Deus também.

Então, após meditar de olhos mergulhados no grande crepúsculo, a pequenina exclamava:
– Ah! como Deus é bom! Ninguém ficou esquecido!

E era de ver-se a sua bondade singular, o interesse pelo dever cumprido, dedicação à verdade e ao bem.
Sobre sua atuação inesquecível, na edificação de afeiçoados seus, destaca Emmanuel:
Creio mesmo que ela nunca satisfez a um desejo próprio, mas nunca foi encontrada em desatenção aos desígnios de Deus. Jamais a vi preocupada com a felicidade pessoal; entretanto, interessava-se com ardor pela paz e pelo bem de todos. Demonstrava cuidado singular em subtrair, aos olhos alheios, seus gestos de perfeição espiritual, porém queria sempre revelar as idéias nobres de quantos a rodeavam, a fim de os ver amados, otimistas, felizes.
Alcione foi um anjo encarnado, em trânsito pela Terra, com a tarefa gloriosa de ajudar a um grupo de Espíritos ligados ao seu coração.

A nobreza de caráter que a distinguia e sua estreita sintonia com os ensinamentos de Jesus fariam dela uma figura inesquecível, beneficiando a todos os que cruzavam seu caminho com valores de um conhecimento espiritual incomparável e de comovente dedicação ao próximo.

Era ela própria a representação marcante da presença de Deus.
***
Curiosamente, encontramos pessoas de boa índole, generosas e esclarecidas que, não obstante, por razões inabordáveis, mostram-se incapazes de reconhecer essa realidade.

Tendo em vista seus méritos, Deus vem em seu auxílio, oferecendo-lhes experiências renovadoras, que surgem à maneira da Estrada de Damasco que marcou a conversão de Paulo de Tarso ao Cristianismo.

A propósito há a edificante história de um farmacêutico, dono de uma farmácia de manipulação.
Era um homem bom, cumpridor de seus deveres, de princípios retos, mas que simplesmente não encontrava espaço em suas cogitações íntimas para a existência de Deus.

Certa feita, fechava mais cedo a farmácia, em virtude de um compromisso, quando entrou uma menina.
– Sinto muito, minha filha. Estou de saída...

– Por favor, senhor farmacêutico, é muito importante. Trago uma receita para minha mãe. Está gravemente enferma. Deve tomar o remédio imediatamente. Corre risco de vida!

Vendo-a tão aflita, o farmacêutico decidiu atendê-la.

Apanhou a receita, foi ao laboratório e rapidamente preparou o remédio com a mistura recomendada.
A menina agradeceu e partiu, apressada.

O bom homem voltou ao laboratório para guardar o material usado.

Estarrecido, verificou que na pressa havia trocado vidros, usando uma substância extremamente tóxica que, se ingerida pela mulher, provocaria sua morte.

Apavorado, correu à entrada da farmácia, olhou a rua em todas as direções, foi até a esquina... Não mais viu a menina.

Tentou entrar em contato com o médico que indicara o medicamento. Não o encontrou.

O tempo passava, célere. Em breves momentos a menina chegaria em casa.

Atormentado, sentindo-se na iminência de converter-se num criminoso, matando a pobre mãe com seu descuido, caiu de joelhos e, erguendo o olhar, falou, suplicante:

– Deus, se você existe, realmente, ajude-me, por misericórdia! Não quero transformar-me num assassino!
E derramou-se em lágrimas, repetindo rogativas àquele Deus em que não acreditava, mas que era sua última esperança.

Assim ficou por vários minutos, até que alguém tocou em seus ombros.

Voltou-se e, num misto de espanto e alívio, viu que era a menina de retorno.

– Ah! senhor farmacêutico, uma coisa terrível aconteceu. Tão afobada eu estava a correr, na ânsia de levar o remédio para minha mãe, que caí, não sei como. O vidro escapou-me das mãos e se espatifou. Não tenho dinheiro para outra receita. Por favor, atenda-me, em nome de Deus!

O farmacêutico suspirou emocionado:
-Sim, sim, minha filha! Fique tranqüila! Eu lhe darei o remédio, em nome de Deus!

Preparou uma nova receita, agora com infinito cuidado, sem pressa. Entregou o medicamento à menina.
– Deus lhe pague, senhor farmacêutico!

– Vá com Deus, minha filha! Deus a abençoe!

E nunca mais o nome de Deus saiu de seus lábios, nem de seu coração.
***
No desdobramento de nossas experiências acabamos todos reconhecendo a Presença Divina. É algo muito forte em nós. Mesmo entre os piores criminosos e viciados dificilmente encontraremos gente negando essa realidade.

O problema da Humanidade, longe de ser o ateu é o à-toa.

Releve-me a expressão, leitor amigo.

Não pretendo enquadrá-lo, até mesmo porque o heróico esforço de enfrentar este precário exercício de literatura espírita situa você acima do mortal comum, este sim, à-toa no sentido da indolência, da indiferença em relação aos objetivos da existência humana.

Quando os homens se derem ao trabalho de refletir um pouco sobre o significado da presença de Deus nos Universo, a exercitar a Justiça Perfeita, dando a cada um segundo suas obras, como ensinou Jesus, não mais veremos gente à-toa.

Haverá apenas gente à toda, em pleno empenho por transformar a crença em Deus numa gloriosa existência com Deus!

Do livro A Presença de Deus
                                                   O SÁBIO E O PÁSSARO

Conta-se que certa feita um jovem maldoso e inconseqüente resolveu pregar uma peça em idoso e experiente mestre, famoso por sua sabedoria.
– Quero ver se esse velho é realmente sábio, como dizem. Vou esconder um passarinho em minhas mãos.
Depois, em presença de seus discípulos, vou perguntar-lhe se está vivo ou morto. Se responder que está vivo, eu o esmagarei e o apresentarei morto.
Se afirmar que está morto, abrirei a mão e o pássaro voará.
Realmente, uma armadilha infalível.

Aos olhos de quem presenciasse o encontro, qualquer que fosse sua resposta, o sábio ficaria desmoralizado.

E lá se foi o jovem mal intencionado, com sua artimanha perfeita.
Diante do ancião acompanhado dos aprendizes, fez a pergunta fatal:

– Mestre, este passarinho que tenho preso em minhas mãos, está vivo ou morto?
O sábio olhou bem fundo em seus olhos, como se perscrutasse os recônditos de sua alma, e respondeu:
– Meu filho, o destino desse pássaro está em suas mãos.

***
Esta história pode ser sugestivo exemplo da perversidade que não vacila em esmagar inocentes para conseguir seus objetivos.

Será, também, uma demonstração das excelências da sabedoria, a sobrepor-se aos ardis da desonestidade.

É, sobretudo, uma ilustração perfeita sobre os mistérios do destino.
Consideram muitos que tudo acontece pela vontade de Deus, mesmo a doença, a miséria, a ignorância, o infortúnio…

Trata-se da mais flagrante injustiça que cometemos contra o Criador, o pai de infinito amor e bondade revelado por Jesus.

A Vida é dádiva divina, mas a qualidade de vida será sempre fruto das ações humanas.
Segundo os textos bíblicos, fomos criados à imagem e semelhança de Deus.

Filhos do Senhor Supremo, o que caracteriza nossa condição é o poder criador, que exercitamos usando prodigioso instrumento – a vontade, a moldar nosso destino e interferir no destino alheio.

***
Há os que não vacilam em esmagar a Vida para alcançar seus objetivos, envolvendo-se com a ambição e a usura, a agressividade e a violência, a mentira e a desonestidade, o vício e o crime…
E há os que libertam a Vida, estimulando-a a ganhar as alturas, mãos abertas para a solidariedade.

Entre essas duas minorias, que se situam nos extremos, temos a maioria que não é má, mas não assume compromisso com o Bem.

Por isso, o mal no Mundo está muito mais relacionado com a omissão silenciosa dos que se acreditam bons, mas não desenvolvem nenhum esforço para evitar que os maus façam barulho.

Isso está bem claro na questão na questão 931, de O Livro dos Espíritos:

Por que, no Mundo, tão amiúde, a influência dos maus sobrepuja a dos bons?
Observe, leitor amigo, o alcance da resposta, uma das mais contundentes da Codificação:
Por fraqueza destes.
Os maus são intrigantes e audaciosos, os bons são tímidos. Quanto estes o quiserem, preponderarão.
Poderíamos acrescentar que a omissão dos bons favorece ainda que as pessoas se envolvam com o mal, por que ninguém as ajuda, nem ampara, nem orienta, nem as atende em suas carências e necessidades.

***
Algum progresso tem sido alcançado.

Fala-se muito, na atualidade, sobre cidadania.

Ser cidadão é estarmos conscientes de nossos direitos.

É lutarmos por eles, a partir dos elementares direitos à saúde, à educação, à habitação e, sobretudo, o inalienável direito à vida.

É um passo importante.

Podemos melhorar as condições de vida de uma sociedade, trabalhando pelos direitos humanos.

Mas há outro passo, bem mais importante:
Assumir deveres.
Destaque-se o dever básico:
Exercitar a solidariedade.
Jesus deixa isso bem claro ao recomendar que nos amemos uns aos outros e ao proclamar que devemos fazer pelo próximo o bem que desejaríamos receber dele, se sofrêssemos suas carências.
***
A mão que liberta o homem da doença, da miséria, da ignorância, do infortúnio, para que a Vida ganhe as alturas, deve ser a filosofia de trabalho de todas as pessoas que desejam contribuir em favor de um mundo melhor.

A Doutrina Espírita deixa bem claro que não podemos nos omitir diante das misérias humanas.

É preciso fazer algo pelo semelhante.

O destino de nossa sociedade é o somatório de nossas ações.

Não se faz uma sociedade boa se, a par do exercício de cidadania, não houver o cultivo da solidariedade.

E aqueles que participam, que se dedicam a esse mister, logo fazem descobertas maravilhosas.

No empenho de ajudar o próximo, libertam-se das angústias que afligem o homem comum, preso ao egoísmo.

Ajudando alguém a erguer-se de suas misérias, pairam acima das inquietações humanas.

Contribuindo para clarear sendas alheias, iluminam o próprio caminho.
Estimulando ao bem seus irmãos, com a força do exemplo, percebem, deslumbrados, que encontraram sua gloriosa destinação.

Livro "O Destino em Suas Mãos"
Editora CEAC - Bauru



sábado, 11 de janeiro de 2014


                           INFÂNCIA E ABORRESCÊNCIA

Um amigo, às voltas com filhos adolescentes, que ele chama de “aborrescentes”, suspirava:

– Ah! Que bom seria se a criançada dormisse no início na puberdade e despertasse na idade adulta!

Reporta-se à complexidade desse ser estranho, instável, inseguro, impertinente, ansioso por auto-afirmação, adepto fervoroso da contestação, que olha com desdém para os pais, “esses caretas, mais por fora que braço de afogado”.

E pretende ser dono de seu nariz, embora conste como dependente na declaração de renda familiar, para todos os efeitos, até mesmo quando exercita a liberdade de decidir como vai gastar a mesada.

A solução não seria pô-lo a dormir, mas ajudá-lo a despertar.

O grande problema do adolescente é justamente o fato de ser alguém que chega ao fim de longo sono, a partir de seu mergulho na carne.

Completado o processo reencarnatório, o Espírito, que até então era pouco mais que um sonâmbulo, começa a entrar na posse de si mesmo, de suas tendências e aptidões, embora guardando completa amnésia em relação às experiências anteriores.

A proverbial relutância quanto aos cuidados do próprio corpo, envolvendo higiene, saúde, regime alimentar, sempre me pareceu mero resultado de longo estágio no plano espiritual, a chamada erraticidade, onde certamente perdeu o contato com elementares disciplinas sobre o assunto.

***
Na questão 383, de O Livro dos Espíritos, quando Kardec pergunta qual a utilidade de o Espírito passar pelo estágio da infância, diz o mentor:

Encarnando, com o objetivo de se aperfeiçoar, o Espírito, durante esse período, é mais acessível às impressões que recebe, capazes de lhe auxiliarem o adiantamento, para o que devem contribuir os incumbidos de educá-lo.

Observe, leitor amigo, a importância dessa informação!

O período de infância é propício para que influenciemos o Espírito, educando-o para a vida, ajudando-o a superar suas imperfeições e mazelas.

Fragilizado, em face das próprias limitações físicas, sem condições para desenvolver iniciativas próprias, ele é receptivo aos exemplos e orientações que recebe dos adultos.

O velho ditado, de pequeno é que se torce o pepino, exprime uma realidade.


Muitas tortuosidades e viciações do reencarnante podem ser superadas com uma educação adequada, conscientes os pais de que, conforme o verso do poeta inglês William Wordsworth, citado por Machado de Assis (1839-1908), em Memórias Póstumas de Brás Cubas, a criança é o pai do homem.

Tendências e mazelas não superadas na infância, herança do pretérito, moldarão o caráter do adulto.
***
Bem, e a adolescência – perguntará o leitor – para que serve?

Meu amigo diz que nesse estágio invertem-se as posições.

Na infância educamos nossos filhos.

Na adolescência, eles nos educam.

Somos convocados a exercitar a paciência, a tolerância, a compreensão, o espírito conciliador, a fim de não transformar o lar em arena de intermináveis brigas e discussões.

Dentre as diatribes contestatórias do adolescente está a expressão que costuma usar, quando chamado às falas pelos genitores, em relação ao seu comportamento.

– Não cobrem nada de mim. Não pedi para nascer!
Pretende que não o consultaram para tê-lo como filho.

Conseqüentemente, que tratem de aceitar suas inconveniências.

O impertinente não tem nenhuma noção sobre essa tolice, que proclama enfaticamente.

Se algo conhecesse sobre as vidas sucessivas jamais falaria assim, tendo em vista o contingente de Espíritos desencarnados a espera da oportunidade de um mergulho na carne para experiências redentoras.

Certamente ele pediu, sim, insistentemente, para que seus pais lhe concedessem a abençoada oportunidade do recomeço, sem a lembrança do passado, a fim de vencer paixões e fixações que precipitaram seus fracassos e o infelicitam.

***
É típico do adolescente situar os pais por incompetentes que não enxergam um palmo adiante do nariz.

Julga-se capaz de fazer muito mais por si mesmo.

É bom que o faça.

Seu futuro depende disso.

Mas, certamente, quando estiver às voltas com filhos adolescentes há de mudar sua opinião, reconhecendo que os “velhos” fizeram bem mais em seu benefício do que o supunha sua pretensa sabedoria.


Richard Simonetti

sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

                                        LIGAR O DESCONFIOMETRO

Ligar o desconfiômetro!
Durante três décadas, participei de um grupo de visitação a hospitais.

Levávamos uma palavra amiga, particularmente aos enfermos solitários, tão carentes de calor humano.

Freqüentemente, topávamos com pessoas vitimadas por facadas, tiros, socos, pontapés…
Jamais encontramos alguém disposto a assumir alguma culpa. Eram sempre vítimas.

Iam passando…

Apartavam uma briga…

Sofreram um assalto…

O mesmo ocorre nas prisões.

Sentenciados proclamam-se injustiçados, vítimas da polícia, dos promotores e magistrados…

Acontece com os piores facínoras.

Criminosos notórios por suas maldades, do tipo Adolf Hitler, Joseph Stalin, Sadam Husseim, Slobodan Milosevic, Osama bin Laden, responsáveis por atrocidades abomináveis, julgam-se pessoas maravilhosas, nobres idealistas, santos missionários!

Trazem o “desconfiômetro” desligado.

Possuem uma visão glamourizada de si mesmos.

Enxergam o mundo por lentes egocêntricas, incapazes de reconhecer suas mazelas e a perversidade que lhes marca o comportamento.

***
Não se trata de uma deficiência isolada, mas de uma tendência globalizada.
Como o egoísmo é a inspiração das ações humanas, tendemos a ver o mundo pela ótica de nossos desejos e interesses, comprometendo-nos em desvios de comportamento e desajustes, sem nos darmos conta disso.

• O viciado não reconhece sua dependência.• O adúltero reclama insatisfação conjugal.
• O assaltante alega lutar pela sobrevivência.
• O maledicente imagina defender a verdade.
• O usurário pretende ser econômico.
• O ditador julga-se um missionário.
Falta-lhes um referencial, algo que lhes permita distinguir o certo do errado, o justo do injusto…

***
O Evangelho é, sem dúvida, o código celeste que sinaliza a melhor atitude, o comportamento ideal.

Há um problema:

Tendemos a examina-lo também pela ótica de nossos interesses e limitações distorcendo-o ao sabor de nossas conveniências.

Um pregador exaltava o perdão como virtude cristã essencial à nossa estabilidade íntima.
E citava Jesus, em Mateus, 5:39:

– Eu, porém vos digo: Não resistais ao mal que vos queiram fazer. Se alguém vos bater na face direita, oferecei-lhe a outra.
Mal terminara a leitura, um homem aproximou-se e deu-lhe valente tapa no rosto.

Sentindo-se testado, nosso herói moveu lentamente a cabeça, oferecendo-lhe a outra face.

O impertinente o esbofeteou novamente.

Eis que se deu o inusitado: o pregador pulou em cima do agressor, derrubando-o e desferindo-lhe uma saraivada de socos e pontapés.

Contido e questionado pelos fiéis, explicou:

– O Evangelho manda que ofereçamos a outra face a quem nos bate. O que acontece depois, se ele reincide, é por nossa conta!

Levando a orientação evangélica ao pé da letra, segundo suas conveniências, não entendeu que Jesus usava uma imagem forte para demonstrar que jamais devemos revidar ao mal com o mal.

Razoável que contenhamos o agressor, mas inconcebível, à luz do Evangelho, que desçamos à agressividade.

***
A Doutrina Espírita situa-se como poderosa lente, permitindo-nos uma visão mais clara e incisiva dos valores evangélicos.

Nas manifestações dos chamados Espíritos sofredores, em reuniões mediúnicas, vemos o que nos aguarda na espiritualidade.

Por mais parcial e benevolente seja o julgamento que fazemos de nós mesmos, é impossível nos furtarmos à comparação com aqueles que nos antecederam.

Colhendo as conseqüências de mazelas e imperfeições que cultivaram na Terra, representa o nosso futuro, o que nos espera, se insistirmos em idêntico
comportamento, induzindo-nos a uma providência elementar e altamente salutar:

Livro: Para rir e refletir

quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

                                             O PREGUIÇOSO

Era indolente por vocação.

Infenso a qualquer iniciativa, vivia miseravelmente.
Ainda que não faltassem oportunidades de melhorar de vida, logo tratava de afastar-se da “tentação”.


Para dar-lhe uma lição, no empenho por “acordá-lo”, algumas pessoas decidiram simular seu enterro, comunicando-lhe:


– Já que você não se dispõe a mexer-se, melhor que vá para debaixo da terra.


E o enfiaram num caixão e seguiram para o cemitério, sem que nosso herói reagisse, guardando a habitual indiferença.
Durante o cortejo, um transeunte perguntou quem era o “defunto”.


– É um preguiçoso que não serve para viver. Não tem onde morar, nem o que comer...


Compadecendo-se, o desconhecido ofereceu:


– Se o problema é de comida, posso ajudar. Darei um saco de arroz para sustentá-lo.


O “falecido”, que tudo ouvia, levantou a tampa do caixão:
– Em casca ou limpo?


– Em casca.
– Então, pode seguir com o enterro.


***

Pois é, amigo , a indolência é, realmente, a “morte em vida”.

O indivíduo perde a iniciativa e passa a vegetar, alheio à dinâmica da existência, sinônimo de movimento.

Fundamental que entremos em compasso, até para que não atrofiemos os músculos, perturbemos os neurônios ou comprometamos o coração, como o demonstra hoje, claramente, a ciência médica.


Raros os que não se envolvem com a ociosidade, em alguma fase da vida, exprimindo tendências bem típicas do estágio evolutivo em que se situa a humanidade.


A própria encarnação, o vestir do escafandro de carne para o mergulho na matéria densa, é um dos recursos usados por Deus para fazer com que o Espírito mexa-se.


Submetidos a um corpo que deve ser sustentado e protegido, sob a égide do instinto de conservação, vemo-nos na contingência de “dar duro”, para atender às suas necessidades.


Se permanecêssemos indefinidamente no mundo espiritual, onde ninguém morre de fome ou frio e se sobrevive sem abrigo, tenderíamos a estacionar.


Essa necessidade está bem definida na fantasia bíblica, quando Jeová diz a Adão que deveria ganhar o pão de cada dia com o suor do rosto.


Abençoado suor, que nos liberta da inércia.


***

Uma fase crítica, nesse particular, diz respeito à chamada terceira idade, depois dos cinqüenta, no outono da existência.

Não raro, situação financeira estável, garantida o sustento diário pelos proventos de aposentadoria, as pessoas entendem que podem desfrutar as benesses da ociosidade.


Lembrando a história que abriu estes comentários, podemos afirmar que num estágio dessa natureza, quando perdemos a disposição de aprender, de produzir para a sociedade, de crescer em conhecimento, de lutar contra as imperfeições, só servimos mesmo para… morrer.


Imagino que Deus nos dá tempo limitado na Terra, justamente porque há uma tendência para nos acomodarmos, caindo num marca-passo espiritual.


Aprendemos com a Doutrina Espírita que não há retrocesso.


Ninguém retrograda nos caminhos da evolução, mas raros fogem ao estacionamento, a partir de determinada idade, acomodando-se às próprias mazelas.

Então, vem a morte, um choque evolutivo de alta voltagem, a agitar nossa alma.


Somos projetados no mundo espiritual, onde se faz a aferição da jornada humana, com a avaliação de méritos e deméritos a determinarem em que região estagiaremos e a natureza das novas experiências, sempre objetivando nosso crescimento.
Com o tempo, tendemos a nos acomodar.


Vem o choque reencarnatório.


Mais alguns decênios, novo acomodamento.


Vem o choque desencarnatório.


Assim, de choque em choque, habilitamo-nos superar a tendência ao dulce far niente, para assumirmos as responsabilidades de filhos de Deus, chamados a colaborar com o Nosso Pai na obra da Criação.