quarta-feira, 15 de abril de 2015

                                     Caridade com meias sujas

Aconteceu numa casa espírita do Estado do Rio de Janeiro. Um frequentador chegou com uma sacola de roupas infantis para serem doadas. 

Entre as roupas, e em evidência, um par de meias sujas. Tão em evidência que foram notadas pelo voluntário da casa espírita assim que a sacola passou para a mão dele.

De início, a vontade desse colaborador foi chorar. De tristeza. Afinal, o bom senso recomenda que não se deve fazer caridade com meias sujas. Por falar nisso, o que é caridade?

Não há (e nem sei se houve um dia), no currículo escolar brasileiro, uma disciplina chamada etimologia. E o que é etimologia? É a ciência que estuda de onde vêm as palavras, mostrando como são formadas e o que significam.

Caridade não deixa de ser sinônimo de amor. Os teólogos cristãos empregam, de forma distinta, duas palavras para o amor. Eros (deus grego do amor) é o amor carnal; ágape (banquete fraterno do início da era cristã), o amor espiritual. 

Pois bem, o amor ágape, que é o amor da reunião, do estar junto de forma fraterna, dividindo tudo com prazer, é traduzido na língua portuguesa por caridade, palavra derivada do latim, caritas, que significa grande amor.

O apóstolo Paulo, em Coríntios, cap. 13, versículos 1 a 3, diz:

Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, se eu não tivesse a caridade, seria como um bronze que soa ou como o sino que tine. E se eu tiver o dom de profecia, e conhecer todos os mistérios, e quanto se pode saber; e se tiver toda a fé, até o ponto de transportar montes, e não tiver caridade, não sou nada. E se eu distribuísse todos os meus bens em o sustento dos pobres, e se entregasse o meu corpo para ser queimado, se todavia não tivesse caridade, nada disso me aproveitaria.

Em suma, se eu não tiver o amor em forma de movimento, amor fraterno que compartilha tudo de forma prazerosa, nada serei.

Eis por que Allan Kardec, em “O Livro dos Espíritos”, nomeia a última Lei Moral como Lei de Justiça, Amor e Caridade. 

Amor é a força que rege o universo, que vitaliza. Justiça é o amor que corrige, educa e leva ao amadurecimento. 

Caridade é o amor dinamizado, é a prática pela qual deixamos fluir o amor, seja na forma de bondade, compaixão... Basta consultar a questão 886 da obra citada. 

Está lá: “Caridade, segundo Jesus, não se restringe somente à esmola, mas abrange todas as relações com os nossos semelhantes, sejam eles nossos inferiores, nossos iguais ou nossos superiores”.

Por que tantas definições e explicações? 

Para dizer que doar meias sujas a pessoas carentes não é fazer caridade. Se a caridade abrange todas as relações com os nossos semelhantes, devemos dar a quem precisa roupas e objetos que façam o necessitado se sentir valorizado, nunca inferiorizado ou humilhado.

Amigos meus de outras religiões já me contaram da quantidade de quinquilharias que recebem de doação para encaminhamento aos socialmente carentes: móveis quebrados, roupas sujas e rasgadas, remédios e mantimentos fora do prazo de validade, livros despencados... No meio espírita acontece a mesma coisa. Infelizmente, muitas pessoas não conhecem nem praticam o real significado da palavra caridade. Se conhecessem, não tirariam do armário as tralhas para serem doadas.

Caridade nunca será sinônimo de dar qualquer coisa aos pobres. São pobres, não é mesmo? Então, qualquer bugiganga serve?

 Nada disso! 

Caridade é doar com prazer tudo que estiver em bom estado, na certeza de que o necessitado que receber a doação fará bom uso dela, igualando, dessa forma, na mesma vibração de amor, quem a doou e quem a recebeu.

Bibliografia:
1 - MOLLO, Elio. Amor e Caridade. É Bom Saber Quem é Quem.

Marcelo Teixeira – O Consolador