Por que o socorro, às vezes, chega tarde?
Existe um fato que muito nos marcou e que contamos no jornal “O Imortal” no mês de maio de 2009.
Como há histórias que sempre nos ensinam, vou tentar
recontá-la.
No
ano de 1997 atendíamos em um ambulatório clínico na cidade de Londrina e,
frequentemente, éramos visitados por representantes de empresas produtoras de
medicamentos que vinham divulgar os seus medicamentos ou fazer lançamentos de
novos produtos.
Nessa
época, um frequentador de nosso Núcleo Espírita experimentava um gravíssimo
câncer de fígado, em fase terminal, o que despertava em nós, daquele grupo, um
sincero desejo de ajudar.
Fizemos
uma reunião e decidimos por visitá-lo, alternadamente, de maneira que ele não
ficasse nem uma só semana sem a presença de alguém de nossa casa, para
estimulá-lo, nessa hora difícil.
Orávamos com ele enquanto aplicávamos passes
magnéticos.
Certa
sexta-feira, um desses representantes adentrou nosso consultório, bastante efusivo,
dizendo estar ali para falar de importante lançamento: uma medicação
antiespasmódica de profunda utilidade nas dores hepáticas, incluindo as
causadas por câncer de fígado.
Imediatamente
nos lembramos do amigo enfermo, e solicitamos algumas amostras, com a ideia de
visitá-lo ainda naquela noite...
O que não fizemos. Deixamos a visita para a
outra semana, acreditando que alguém do grupo já estaria se desincumbindo dessa
tarefa por aqueles dias.
Alguns
dias depois, lembrando-nos de nosso dever para com nosso irmão, fomos até a
casa do amigo.
Logo na entrada, sua esposa, lavando a calçada, sem muita emoção
nos avisou: -
“Nem adianta entrar, ele está muito magoado. Faz três dias
que está em crise de dor e nada o alivia. Parou até de orar... porque diz não
estar adiantando...”.
Pedimos,
então, para que ela já fosse preparando o remédio novo enquanto nos dirigimos
ao seu quarto. Ele estava de costas para a porta e, quando o cumprimentamos,
mal respondeu, demonstrando profunda amargura.
Tentamos um diálogo, meio sem
sucesso, quando ele lentamente se virou para nós e disse:
“Sabe, eu
acho que Deus só cuida de seus filhos depois que vão para o lado de lá... Faz
três dias que estou com essa dor insuportável, e apesar das minhas preces, nada
de melhorar”.
Nesse
momento, contamos para ele a história do remédio que carregávamos conosco e que
já estava no porta-luvas do nosso carro há alguns dias e, no mesmo instante,
sua esposa adentrava o recinto com uma xícara com água, já com o medicamento.
Num
súbito, como quem sai de profunda dor e ilumina seus olhos com o retorno da
esperança, ele, bastante sincero e agora sem o semblante da mágoa, lançou seu
olhar sobre nós e disse:
“Então não foi Deus quem se esqueceu de
mim?... Foi você?”.
Sem
ter como nos desculpar, rimos por ver sua alegria voltar e completamos:
-“Pois
é, meu irmão, veja com quem Deus tem que contar para socorrer seus filhos.
Por
isso é que o socorro às vezes chega tarde.
Não é pela ausência da piedade
paterna, mas pela falta da caridade dos cristãos de hoje”.
Abraçamos-nos,
com muito cuidado, porque o estado dele era muito frágil. Em poucos dias ele
desencarnou, deixando comigo uma profunda reflexão.